Mulheres que fotografam: Camila Cornelsen
De videoclipes pop a documentários e ensaios independentes, a fotógrafa que faz de um tudo
Publicado em 07/2017
O que o (incrível) clipe de "Lalá", da Karol Conka, algumas campanhas da Avon, o vídeo de "Moon", do Thiago Pethit, a banda Copacabana Club, os ensaios de mulheres poéticos e empoderadores do Tumblr X Real e alguns gifs de rainhas de bateria das escolas de samba de SP têm em comum? A Camila Cornelsen – ou Cacá, para os íntimos
A curitibana consegue reunir vários títulos quando vai preencher o campo “profissão” em uma ficha qualquer e, depois de ter sido até engenheira civil, hoje se dedica mais à fotografia e à direção de fotografia pra cinema. Ah, ela também é meio Mister M de vez em quando, tipo quando nos ajudou a desvendar o segredo daqueles gifs maneiros com fotos 3D.
Camila também é a fotógrafa da vez da nossa série de zines sobre mulheres que trabalham com fotografia – que começou com as nossas minas, Bleia, Elisa e Helena. A voz, remelexo e gifs da Cacá Cornelsen você já conhece, então vem saber mais sobre a história e trabalho dela.
Quando você começou a fotografar? O que despertou a vontade de trabalhar com fotografia? Como filha de fotógrafo sempre estive entre câmeras, laboratório e estúdio, mas meu pai gostaria que escolhêssemos profissões mais seguras, então nunca incentivou muito. Em 2001, depois de já ter ingressado a faculdade de engenharia civil, comecei a roubar a câmera dele, que, na época, era uma das primeiras digitais. Comecei fotografando shows de hardcore, bandas de amigos e criando ensaios aleatórios. Aos poucos, ele foi percebendo que meu interesse era grande e que eu levava algum jeito pra coisa e começou a me dar dicas mais preciosas. A partir de 2005, depois de já ter me formado (e desistido da área de exatas) me joguei na fotografia e assumi que era isso mesmo que eu queria fazer da vida profissionalmente.
Quando e por que começou a trabalhar com direção de fotografia pra cinema? A direção de fotografia real-oficial surgiu em 2012, depois de algumas crises do retorno de Saturno... "O que fazer? Como lidar?"! Como já trabalhava com still (e com luz contínua) há bastante tempo, a transição para o cinema foi menos dolorida. Fiz alguns cursos curtos em escolas de cinema e me mudei de Curitiba pra São Paulo, onde a área tem muito mais oportunidades.
Chegou a trabalhar (ou ainda trabalha) com outra coisa além de fotografia? O quê? Muitas! Esse talvez tenha sido o maior - ou melhor - problema de todos. Tive programa de rádio e comecei a discotecar em 2006. Tive a Copacabana Club, de 2009 até 2014, que está num hiato porque moramos longe. Esse movimento foi bem legal, por me proporcionar vivências incríveis de turnê e festivais. Agora estou me dedicando a um novo projeto de música, num duo. Hoje em dia entendo que a música, a fotografia e o cinema andam muito bem juntos e um ajuda a inspirar o outro de alguma forma. Continuo fazendo tudo-ao-mesmo-tempo-agora.
Em "Lalá", Camila assina a co-direção (ao lado da amiga Vera Egito), a direção de fotografia e a edição.
Fez algum curso ou aprendeu a fotografar sozinha? No início, quando roubava a câmera do meu pai, aprendi sozinha... Ao longo do tempo ele foi me ensinando algumas coisas.
Qual equipamento você usa? Aprendi com Nikon e Hasselblad e tenho um verdadeiro amor por essas marcas. Hoje em dia, no trabalho corriqueiro do dia a dia, de digital uso Canon 5D, porque eu também filmo e ela ajuda a quebrar uns galhos nesse aspecto. Mas de uns tempos pra cá venho querendo migrar de formato. Gostaria muito de trabalhar com médio formato digital, que é o que meu pai também tem usado... só falta uns dinheirinhos hahahaha. Mas eu ainda uso bastante filme e tenho uma coleção de analógicas em casa que sempre fico revezando, tanto 35mm, 120mm e uma grande formato 4x5".
O que você mais curte fotografar? Pessoas. Mas de uns tempos pra cá, por conta do X Real e das lutas diárias do feminismo, vários trabalhos, não só pessoais, mas comerciais também, têm me levado a retratar mulheres e isso é incrível. E em viagens, por que não (?), paisagens!
Tem algum projeto pessoal de fotografia? Qual? Tem o X Real que já faço há quase 6 anos, onde retrato mulheres em suas casas. De preferência nuas. E esse foi um processo de desconstrução mega intenso pra mim. Ver outros corpos e permitir que outras mulheres também vissem outros corpos é um exercício imenso de empatia, sororidade, aceitação. Fora o X Real, sempre me enfio nuns ensaios com outros temas e pessoas que estejam afim de serem fotografadas, mas não tem um lugar específico onde coloco eles. Tá tudo lá no meu site, espalhadinho.
Quando postei o clipe da Karol Conka, o Instagram deletou a minha conta (!!!), então eu criei uma nova acreditando que a anterior não voltaria. Ela voltou na semana passada e essa nova conta eu transformei no @salasolar, que é dedicado a ensaios e retratos que eu faço na sala aqui de casa. Uma sala todinha branca que eu pintei só pra receber pessoas e me dedicar às minhas ideias.
Trailer do documentário "Bunda Dura Não Treme: Porque ser mulher é foda", que tem co-direção e direção de fotografia da Camila.
O filme foi exibido no Festival de Los Angeles - Dances With Films, nomeado o melhor doc no Festival Cinalfama Lisbon International Film Awards e para melhor trilha sonora original (Camila Cornelsen e Modular Safari). Coisa chique, tá?
Diz aí quem são as mulheres que influenciam o seu trabalho. Eu sempre me influenciei por mulheres em diversas áreas, na música, na escrita, na fotografia, artes, enfim. Pra dizer alguns nomes, Luiza Roldán, primeira escultora documentada na Espanha em meados de 1670, Pina Bausch, Patty Smith, Diane Arbus, Nan Goldin, Louise Dahl-Wolfe. E sei lá, ultimamente, acho que a gente tem visto mais mulheres também fazendo coisas legais e sendo vistas e mostradas. Pra trazer pro nosso cenário mais atual acho o trabalho da Nicole Heiniger absolutamente lindo, tive a sorte de já ser clicada por ela no começo da sua carreira. Vivi Bacco, Juno Calypso, Arvida Byström, Polly Penrose,… posso fazer uma lista! :)
Por que é importante termos mais mulheres trabalhando com fotografia no Brasil? Acredito que de fato temos um olhar diferente dos homens… no geral. Acho que temos mais capacidade de nos identificarmos com temas mais sensíveis, temos mais empatia. Não acho que somos melhores, somos apenas diferentes. Sempre tivemos muito menos oportunidades, então, profissionalmente, ainda não alcançamos o mesmo status dos homens que já estão no mercado. Estamos vivendo um momento onde brechas estão se abrindo, lentamente, mas estão se abrindo, e ninguém nunca perguntou como a gente enxergava as coisas. Temos que aproveitar essa fenda pra mostrar!
"No idioma japonês, aware faz parte da expressão 'mono no aware', indicando uma espécie de nostalgia e de sensibilidade para com a transitoriedade da beleza e da vida, referindo-se a tudo o que é frágil e efêmero, sendo ao mesmo tempo nostálgico, como ocorre com o sakura, as flores de cerejeira.
Na literatura clássica japonesa, 'mono no aware' se refere ao ideal estético, na sensibilidade, na consciência e na capacidade de resposta para com alguma coisa, ou seja, é uma resposta emocional a um fato ocorrido", explica Camila.
Essas são algumas das fotos feitas no Japão para a exposição, que rolou em 2016 em São Paulo e em breve chega a Curitiba.