O movimento Riot Grrrl terá um filme pra chamar de seu
Dirigido por Leticia Marques, longa está em processo de financiamento coletivo pra ser finalizado
Publicado em 08/2017
Se até o início dos anos 90 a cena punk e underground era dominada por bandas de homens por todos os lados, a década terminou com muita mina em cima do palco, mostrando que mulheres sabem, sim, tocar guitarras, baterias e baixos - e muito bem, obrigada.
O movimento punk feminista Riot Grrrl mudou não só a cena musical mundo afora como também a vida de muitas mulheres, como a diretora Leticia Marques, que encabeça o projeto do longa documental "Faça você mesma", que visa aumentar o conhecimento sobre a trajetória feminina através do registro de narrativas onde as mulheres são protagonistas de suas próprias histórias.
"Não existia nenhum registro documentário do movimento Riot Grrrl brasileiro e com isso veio a percepção de que era preciso inscrevê-lo na história. A vontade de contar essas histórias é pessoal, porque eu participei dessa cena e cresci ouvindo muito essas bandas”, explica a catarinense, que escreveu o primeiro esboço do filme em 2013, após ler “Riot Grrrl: Revolution Grrrl Style Now!”, de Nadine Monem.
Três anos depois do rascunho, conversas com a amiga Patricia Saltara reacenderam a vontade de registrar o Riot Grrrl num longa. Com algumas entrevistas gravadas, em maio de 2016 Leticia apresentou o projeto no Union Docs, uma residência artística especializada em documentários que durou quatro semanas, em Nova York. Na volta, a equipe fez mais algumas rodadas de entrevistas por aqui, com integrantes de bandas como Hitch Lizard, Lava, Dominatrix e Biônica.
Agora, Leticia, Patricia e companhia estão em um processo de financiamento coletivo, através do Catarse, para finalizar a produção e captação das conversas com integrantes das principais bandas que construíram a cena Riot Grrrl nacional - que, infelizmente, não era o paraíso das minas.
“A Gigi Louise conta em entrevista que a primeira vez que ela sentiu o machismo foi no palco depois de ter montado a banda Hitch Lizard, algumas pessoas não acreditavam que as músicas e letras eram de fato delas. A Dominatrix teve embates em shows, temos imagens de arquivo de um momento em que um cara sobe no palco e desafia a vocalista, Elisa Gargioulo, e homens carecas também já ficaram na frente do palco encarando as integrantes. Acho que Dominatrix foi a banda que mais sentiu essas atitudes reacionárias por parte dos caras”, conta Leticia, que era (e ainda é!) fã de carteirinha da Team Dresch, Dominatrix, Sleater Kinney, Heavens to Betsy e Le Tigre.
“A minha relação com o Riot Grrrl é muito pessoal. O movimento, as bandas, as letras de música, as mensagens e fanzines foram o que me formaram como pessoa, me trouxeram um certo pertencimento numa época da adolescência em que sempre buscamos nos identificar. Acho que o Riot Grrrl foi de fato o primeiro movimento ou ideia com que me identifiquei de verdade, mesmo já conhecendo o anarquismo e outros ideais. Eu aprendi sobre Feminismo, sobre sororidade, sobre ser eu mesma perante o mundo e aprendi muito com o contato e afeto das amizades femininas que surgiram na época. O Riot Grrrl também me trouxe este pertencimento, um sentimento de que há outras pessoas por aí parecidas comigo e que mesmo as que são diferentes se entendem, se respeitam e se unem. As riot grrrls foram minha inspiração para crescer como uma garota que podia fazer o que quisesse independente de gêneros”, declara a diretora.
E se o Riot Girrrl não tivesse existido? Será que hoje o feminismo estaria tão em pauta? Será que teriam por aí tantas camisetas onde se lê “Feminist” (afinal, no Brasil a gente fala inglês)? Letícia aposta que as coisas poderiam ser diferentes: “Acho que esta revolução feminista na música não teria tido o alcance que teve nos Estados Unidos e, consequentemente, no Brasil. Talvez não tivéssemos tantas bandas feministas e femininas e tantas outras manifestações artísticas que se inspiraram neste movimento. Acredito também que o Feminismo não teria tido tanto alcance na cena underground, na arte/cultura e, possivelmente, teria se resguardado mais ao academicismo”.
Então bora bater três vezes na madeira, espalhar por aí que mulheres podem (e devem) ser protagonistas de sua própria história e contribuir com a campanha? O financiamento coletivo para finalizar o filme “Faça você mesma” rola até dia 4 de setembro, nesta página do Catarse.