Gal Costa é eterna e sempre contemporânea
Em show no 'Disco' Voador, musa da Tropicália exibe seu faro apurado e poder único de reinvenção
Publicado em 06/2017
Gal Costa em noite de ingressos esgotados no Circo Voador é privilégio. Por volta das 22h do último sábado (17), um tanto de gente sortuda já se movimentava perto dos Arcos da Lapa, em frente à entrada da lona, para assistir a mais um show da turnê do álbum “Estratosférica”, de 2015, no melhor palco da cidade.
Dos contemporâneos de “Fa-Tal – Gal a Todo Vapor” aos que nasceram na década de 1990, estavam todos ali a postos (e ansiosos!) para ver e ouvir a cantora “mais experimental” da nossa música, como afirmava o cartaz de um fã apaixonado. E, por maiores que fossem as expectativas, provavelmente ninguém tinha ideia do quanto a Gal ainda poderia surpreender naquela noite.
Quem chegou cedo, teve a chance de curtir o show de abertura de Illy, baiana de voz doce que se apresentava pela primeira vez no Circo. Música boa que chamou a atenção dos que já se reuniam pela casa e deu aquela aquecida na vibe. Minutos após a meia-noite, Gal entrou no palco acompanhada de sua afiadíssima banda, composta por Thomas Harres (bateria), Maurício Fleury (teclado), Fábio Sá (baixo) e Guilherme Monteiro (guitarra).
Completamente lotada, a lona do Circo vibrava. Extasiados, alguns admiravam, boquiabertos, aquela Gal que exacerbava frescor, enquanto outros a acompanhavam nos versos das clássicas “Mal Secreto”, “Não Identificado” ou das recentes “Jabitacá” e “Ecstasy”. “Esse lugar é sagrado!”, exclamou a cantora, que sempre se diverte ao chamar a casa pelo apelido carinhoso de Disco Voador.
Com alegria e espontaneidade que levaram o público às risadas em diversos momentos durante a apresentação, Gal deixou evidente o quanto está totalmente à vontade com o repertório que tem explorado nos últimos dois anos. Livre, criativa e plena (tem palavra melhor para definir?) como só Gal poderia ser, ela conduziu a apresentação da forma mais natural e fluida possível. Na pista, o amor por Gracinha era tanto que, além dos elogios gritados, também rolavam uns coraçõezinhos feitos com as mãos. Delírio-amoroso-coletivo.
“Dez Anjos”, canção de Criolo e Milton Nascimento que foi gravada em “Estratosférica”, abriu caminho para uma fila de performances que provaram: a voz de Gal Costa ainda é uma das mais incríveis da música brasileira. Top 3, ok? Ela não deixou dúvidas ao cantar “Acauã”, “Três da Madrugada” e “Arara”. Há de se repetir: que privilegiados os que puderam ouvi-la.
“Vocês acham que eu acho que tenho a idade que eu tenho? Eu não acho, não!”, exclamou a estrela depois de contar memórias vividas ao lado dos amigos Caetano Veloso e Torquato Neto. Gal é novidade, e ela sabe disso. Tem consciência de que cria e canta algo totalmente novo. Ao admirá-la no palco, seus fãs, no ápice da excitação, ao som de “Como Dois e Dois”, também estão conscientes de que a musa da tropicália está à frente. A força criativa de Gal Costa ainda encabeça a nossa vanguarda.
Tranquila, dotada de um humor perspicaz, absurdamente afinada e supersintonizada com seus músicos, Gal deixou todo mundo com saudade antes mesmo de cantar a última canção do setlist. Deu vontade de desfrutar daquele momentinho catártico por uma madrugada inteira. No bis, com “Meu Nome é Gal”, ela “abraçou” quem a assistia em um Circo Voador maravilhado. O show acabava com a certeza de que Gal Costa é eterna – e sempre contemporânea.