I Hate People: Diogo Strausz
Mais uma performance do que um cara. A persona é a banda.
Publicado em 06/2015
Se fosse possível criar a Strauszlândia, ela teria apenas duas ruas, localizadas em um cantinho de Laranjeiras. Ok, três ruas - caso batesse vontade de tomar um sorvete no meio da tarde, como no dia que nós fomos encontrar produtor musical Diogo Strausz em seu estúdio pro papo desse I Hate People.
“Nunca saí de Laranjeiras. O Seu Augusto, da banca aqui em frente (ao estúdio), me vendeu a minha primeira revista pornô, quando eu tinha uns 11 anos. Engraçado é que eu fui comprar só uma Playboy e ele me deu umas revistas com umas histórias pesadonas. Contei isso pra ele outro dia”, recorda Diogo, que mora na rua ao lado.
Esse clima familiar também está na relação de Diogo com a música. A primeira influência veio do pai, Leno, cantor da jovem guarda, desde quando ele tinha uns 3 anos. O principal mandamento ficou na cabeça até hoje: “Os Beatles, os Rolling Stones e os Beach Boys são as maiores bandas do mundo. Ele falava pra eu responder isso sempre que me perguntassem”, comenta.
Se filho de músico, músico é, Strausz acabou passando por quase todas as vertentes do meio. A primeira, como guitarrista da banda R.Sigma, fundada com quatro amigos lá pelos 14 anos. Quando os parceiros de banda começaram a produzir festas, ele foi atrás, organizou algumas e acabou ficando mesmo na cabine, como DJ. Das experimentações em casa, nasceu o primeiro EP, Zombies are making love, em 2011, e junto, o Diogo Strausz produtor musical, que é 70% autodidata, graças a pesquisas na internet, tutoriais no Youtube, fóruns e alguma “encheção de saco” de produtores como Kassin e Pedro Garcia. Hoje, na lista de álbuns com a sua assinatura estão os de Alice Caymmi, Jacob Perlmutter, João Capdeville e o do amigo Castello Branco.
Cada etapa foi uma espécie de aprendizado e é por isso mesmo que ele faz questão de não apagar nenhuma faixa de seu perfil no Soundcloud, pra poder observar o caminho trilhado e a evolução a partir daquela linha do tempo online.
“Acredito muito em você se expor, tentar e não ter tanto medo de como as pessoas vão reagir. Se você lançar uma coisa muito ruim, constrangedoramente ruim, todo mundo vai falar mal e você vai se sentir envergonhado. Se você lançar uma coisa boa depois, todo mundo vai esquecer daquilo que foi ruim. Porque, no fim das contas, a coisa ruim é parte da sua evolução, do seu processo, do seu crescimento. Fora isso, quando você lança algo que não tá tão bom, só não acontece nada. Ninguém vai ver e não vai ter muita repercussão - e parece que as pessoas têm medo disso. Fico feliz de nunca ter tido esse medo”, diz.
A consequência daquele primeiro EP, segundo Diogo, foi esse “nada” - mas só até aparecer o e-mail de um tal Jacob Perlmutter na sua caixa de entrada. Não pense que essa mensagem foi logo o convidando para fazer o álbum “Meanwhile, in Rio”, o primeiro produzido inteiramente no espaço de Laranjeiras.
“Quando lancei o Zombies are making love, contratei uma empresa de divulgação em Boston pra divulgar o trabalho fora do Brasil. Um belo dia, recebi um e-mail de um cara chamado Jacob dizendo que vinha passar o Carnaval no Rio e querendo saber se podia ficar na minha casa porque o Danny, dessa empresa de Boston, tinha me indicado. Sendo que eu tinha trocado dois e-mails na vida com o Danny e ele indicou a minha casa como albergue! O Jacob veio, nós ficamos amigos e, dois anos depois, ele chegou pra produzir o CD. Ele foi uma virada na minha carreira. Foi por causa dele que alugamos essa casa, foi o primeiro álbum feito aqui, e produzir aqui foi a grande virada do meu processo”, conta Diogo, que hoje tem Jacob como um de seus melhores amigos.
Seguindo um dos ensinamentos de Kassin (“Fazer backup sempre. Ter deadline sempre”) e com um espaço sempre disponível para receber a equipe escolhida para cada trabalho, o fluxo de produção ficou mais ágil. Se quando o quarto de Diogo era seu escritório os álbuns de Alice Caymmi e Castello Branco levaram cerca de seis meses para ficarem prontos, o álbum de Diogo, Spectrum vol. 1, foi concluído em um mês na casa nova. Até então, as produções próprias de Diogo se apoiavam na música eletrônica e tinham uma aura mais moderna, mas este álbum parece envolto em um perfume dos anos 70, década cuja estética sônica é uma das paixões do produtor - segundo ele, por ter o som “mais colorido”. Corta para: o que é “som colorido”?
“O som captado pelo microfone pode ser muito limpo, tão limpo que fica sem identidade, fica um som sem cor. Colorir o som é adicionar interferências, colocar um temperinho”, explica Diogo. Basicamente, é a mesma coisa que nós fazemos quando usamos mil aplicativos para adicionar grãos e interferências àquelas fotos feitas com celulares de última geração e resolução incrível.
Além das cores, no trabalho atual Diogo procurou incluir o que chama de “som de sala”. Traduzindo: faixas gravadas com um pequeno eco, um reverb (aquele som batendo na parede), que, a partir dos anos 80, passou a ser incluído digitalmente nas faixas, porque os estúdios ficaram menores e, consequentemente, os intervalos de reverb também.
“Me atraio muito mais pelo som que tem sentimento, que tem esse som de sala. Pra mim, ele conta uma história diferente do som com reverb digital. Já li em algum lugar que o som nunca para de vibrar. Todas as coisas boas e ruins que acontecem em um lugar, quem passou ali, o que foi dito e feito nunca deixou de vibrar ali dentro. E o microfone também capta tudo isso. Aquele som vem com muito mais sentimento, parece que ele tem umas memórias, mesmo não sabendo. Talvez seja uma comunicação num plano muito mais intuitivo”, diz.
Daqui pra frente, ficam os projetos de mexer na acústica do estúdio e “deixá-lo mais bacana”, se organizar para conciliar os projetos pessoais e os trabalhos que estão chegando cada vez mais, fazer shows e romper a timidez para lidar com as pessoas diferentes que o trabalho de produtor exige - porque até no show Diogo se camufla, no meio dos músicos. "Para o público, o show é mais pra curtir o clima do que ver uma persona. É mais uma performance do que um cara. A persona é a banda”, define. Vale assistir.