8 de Março de 2017 - Greve Internacional de Mulheres
Em ato no Rio de Janeiro, mulheres falam quais são suas lutas pessoais por direitos
Publicado em 03/2017
Fotos e registros de manifestações são sempre feitos à distância, mostrando um grande número de pessoas juntas. Mas uma manifestação não é uma massa homogênea, ela é feita de universos únicos, cada um com sua própria luta e revindicação, como pixels humanos.
No ato que marcou o Dia Internacional da Mulher em 2017, batizado Greve Internacional de Mulheres, esses pixels eram muito poderosos. Neste zine, 15 mulheres de diversas idades, profissões e grupos sociais contam os motivos e causas pelas quais lutam e fazem greve. Seguimos marchando.
Renata Montechiare, 34 anos. Antropóloga.
Hoje todo mundo para e eu paro também pra defender o direito das mulheres. Para pedir a legalização do aborto. Para que a gente tenha uma carga horária de trabalho justa, que seja compatível com as nossas tarefas, que seja compatível com a maternidade.
Morgana Oliveira, 23 anos. Estudante de Turismo.
É importante ter esse ato para mostrarmos para a grande massa que, sim, temos direitos. Temos que lutar pelos nossos direitos. Não queremos ser superiores a ninguém, queremos simplesmente a nossa igualdade. Tem os movimentos partidários aqui, mas, em compensação, tem uma galera grande que veio somente pelo movimento, uma galera que está apartidária. Está lindo demais, eu estou emocionada. É isso: é mulher na rua, é gritar. Vamos para frente porque a gente consegue chegar lá um dia
Mari Cota, 25 anos. Pesquisadora.
Eu paro contra o feminicídio, que é a prática do extermínio de mulheres pelo fato de elas serem mulheres. Paro contra a violência sexista, contra o golpe, para lembrar que esse golpe é diretamente contra as mulheres, porque além de ter derrubado a primeira mulher eleita democraticamente presidenta, ele está afetando os direitos das mulheres. Quando tentam fazer a reforma da previdência, as mulheres são diretamente impactadas porque elas são as que mais trabalham, elas são as que são submetidas à jornada dupla e tripla de trabalho. Esse golpe é contra os direitos e a vida das mulheres.
Penso que o Bruno Fernandes de Souza é o caso emblemáico de como o feminicídio opera: ele é um machista que assasinou uma mulher porque ela engravidou e ele não queria pagar pensão. Um cara que ganhava uma fortuna e que agora está solto, impune e solto. Ele é um caso emblemático do que é o feminicídio, de como os homens veem, como grupo, a vida das mulheres como algo descartável, como algo que pode ser retirado e vai ficar impune.
Ele foi chamado para trabalhar em nove clubes. Se uma mulher faz qualquer coisa que prejudica sua imagem, quando ela vai ser chamada para trabalhar? Ela perde o emprego, ela é linchada pela sociedade. (Esse caso) invisibiliza a violência e provavelmente culpa a mulher, porque eu já ouvi muita gente falando que a Eliza Samudio era uma golpista que queria dar o golpe da barriga. A mulher tem culpa até da própria morte dela, sendo que ela foi assassinada. O que aconteceu com ela foi feminicídio. E isso acontece muito no nosso continente. A América Latina é campeã em feminicídio, não tem em nenhum outro lugar tanto quanto tem aqui.
Culpam a vítima, passam a mão na cabeça do criminoso, do assassino, e naturalizam o crime, como se fosse normal matar uma mulher porque ela engravidou. O Bruno é o retrato do Brasil quando o assunto é feminicídio.
Gabriela Graciosa da Fonseca, 28 anos. Produtora cultural.
Faço greve hoje pela posição das mulheres no trabalho e pela falta de direitos sexuais reprodutivos. Estamos sendo limadas o tempo todo, em retrocessos de leis, como a recente que quer eliminar o acolhimento de vítimas de estupro e propõe que elas não tenham acesso a todos os coquiteis que precisam para abortar sem precisar passar pelo procedimento cirúrgico.
Luana Paiva, 16 anos. Estudante.
Luto pelo direito das mulheres, principalmente pelo feminismo negro. Luto pelo o que me faz bem e pelo futuro.
Gabriela, 27 anos. Bióloga. Clarice, quase 3 anos, reforçou coros de "Fora Temer" durante a entrevista.
Eu estou aqui pela minha filha e pelos nossos direitos. Acho que por ser mãe eu virei muito mais ativista e interessada em entender meu papel no mundo. É uma luta constante sobre poder escolher sobre nosso corpo, sobre poder amamentar onde eu quiser, sobre poder ser mãe e estar em casa ou ser mãe e querer trabalhar. Esse lugar da mãe me fez repensar o que é ser mulher.
E ser mãe de menina é igual a ser mãe de menino!
Letícia, 34 anos. Bióloga. Sofia, 1 ano e 2 meses.
Tô aqui pelos direitos das mulheres. Por toda essa questão de igualdade e pelo fim do machismo.
Naomi Vasconcelos. Professora da UFRJ, "grande feminista", sexóloga e escritora.
Sempre estamos em greve. Estamos em greve pelo instinto de vida da mulher, o instinto de sobrevivência, que precisa cada vez mais aflorar, nem que seja por uma luta radical.
Pâmela Carvalho, 24 anos. Educadora.
Faço greve para lutar por direitos iguais, pelos direitos das mulheres e por uma igualdade de gênero e de raça, pensando que as mulheres negras são as que mais sofrem com o machismo e o racismo.
Eu, como mulher negra sofro com o machismo, que assola as mulheres de maneira geral, mas às vezes me vejo em situações de desprivilégio em relação, inclusive, a mulheres brancas, em entrevistas de emprego, em relacionamentos, em questões de autoestima. A minha autoestima teve que ser construída muito na marra, porque, quando era pequena, eu queria ser igual às minhas amigas brancas, eu queria ser a Xuxa. E eu nunca vou ser igual à Xuxa. Então, além de lutar contra o machismo, as mulheres negras têm que lutar para estarem vivas, pois são a maioria da população pobre, da população das favelas e dos sub-empregos, trabalham como domésticas, como terceirizadas em diversas empresas e perdem vários direitos. Então, além de lutar contra o machismo, a gente tem que lutar como mulher negra pela sobrevivência. A gente tem que lutar por direitos básicos, inclusive o de estar viva.
Aline Mohamad, 34 anos, produtora cultural
Parei pelo fim do feminicídio. Parei pelo fim da repressão. Parei pela liberdade de sermos quem somos.
Carolina Pepperli, 28 anos. Estudante de pós-graduação.
Estamos em greve para denunciar os retrocessos que estão acontecendo no reconhecimento que o Estado tinha sobre a divisão desigual sexual do trabalho. O trabalho doméstico das mulheres não está mais sendo reconhecido pelo Estado, haja vista a reforma da previdência, que quer igualar a idade de aposentadoria entre homens e mulheres. A gente está retrocedendo no reconhecimento do Estado do trabalho das mulheres dentro de casa, dentro dos seus lares. Então, hoje a gente faz greve para mostrar para o mundo que se as mulheres pararem, o mundo também para, a produção também para e a sociedade não pode caminhar sem as mulheres em marcha. Seguiremos em marcha até que todas sejamos livres.
Bianca Ferreira de Queiroz, 26 anos. Jornalista.
Hoje eu faço greve pelo direito de não usar blusa nesse calor infernal do Rio de Janeiro e isso ser normal. Por outras coisas também, mas hoje é principalmente por isso (risos).
Érica Thies, 19 anos. Estudante de museologia
Eu não estou fazendo greve porque sou estudante, não trabalho. Venho dar a força porque tenho várias amigas que não puderam faltar ao trabalho porque podem ser despedidas, então eu venho aqui agregar, porque a gente precisa se apoiar.
Trouxe esse cartaz porque venho percebendo que as feministas levantam várias lutas que não me contemplam. Elas dizem que é por conta de empoderamento, por conta da mulher se amar mais, de todas essas coisas. Mas eu moro na Zono Oeste e essas são coisas que se eu fizer ou se uma mana preta fizer, nós não vamos sair vivas. Um exemplo é o free niple (mamilos livres), não podemos fazer isso na Zona Oeste atualmente porque vamos ser assediadas de uma maneira bem foda, vamos desaparecer. É foda realmente a violência que sofremos. Então trouxe essa mensagem para discutir o que realmente é empoderamento e se ele faz bem mesmo
Alba Canovas, 31 anos. Estudante de doutorado. Espanhola.
Faço greve pelo direito das mulheres, pela igualdade das mulheres e pelos direitos reprodutivos da mulher. Hoje em dia, não temos liberdade de decisão. Não temos as informações necessárias e nem os direitos que precisamos para poder decidir o que fazer com nosso corpo e também com a nossa reprodução.
Na Espanha, o aborto é permitido. Já tentaram proibir o aborto no governo de direita atual, mas, graças à repressão pública, conseguiram que essa lei não fosse para frente. Continuamos podendo abortar, se esse for o nosso desejo.
Aqui no Brasil eu acho que é uma coisa muito forte. Você fica desamparada caso aconteça alguma coisa, e nem quero mencionar todas as possibilidades horríveis que podem acontecer se você não tiver condições de ter uma criança nesse mundo e não tiver a opção de escolher. Acho isso muito forte. Muitas mulheres têm que passar por processos ilegais que podem levar até à morte e gastar uma grana que não têm. Isso é desumano.
Denise Azevedo, 58 anos. Professora aposentada da rede pública.
(A primeira da foto, da esquerda para a direita)
Faço greve para que todas as mulheres não tenham nenhum dos seus direitos reduzidos e para que conquistem novos, porque ainda tem muita gente que não tem acesso a várias coisas. Na verdade, eu me sinto uma mulher muito livre, independente, consegui tudo o que eu queria, sou mãe solteira e lutei por isso na década de 80. Mas eu vejo muitos retrocessos e muitas mulheres que ainda estão subjulgadas e que ainda não percebem os direitos que têm. Então eu também luto por elas. Para manter o direitos que eu tenho e conquistei e para que outras (mulheres) também tenham (direitos).