Relato Rosa
Uma reunião artística pela conscientização do câncer de mama.
Publicado em 11/2018
Mais uma vez o pessoal do Café Preto Tattoo e FENDA se reuniu para uma ação dentro do Outubro Rosa! Antes de falar sobre a exposição em si, vamos falar sobre o projeto rapidinho.
O CAFÉ ROSA - Um laço para sempre - é um projeto das duas labels junto a diversos colaboradores com objetivo de incentivar a luta contra o câncer de mama.
O projeto possibilita que mulheres possam tatuar gratuitamente as cicatrizes deixadas pela luta contra a doença. A ação ocorreu durante todo o mês de Outubro de 2018 e pode se estender de acordo com a demanda de tatuagens e disponibilidade dos artistas. Além de organizar e disponibilizar xs tatuadorxs do Café Preto Tattoo + convidados, o projeto contou com ações em Florianópolis e no Rio de Janeiro.
Relato Rosa - Exposição
No dia 27 de outubro a exposição “Relato Rosa” trouxe um olhar para o encontro entre as histórias das mulheres com a interpretação de artistas em diferentes linguagens. O evento ocorreu no Rio de Janeiro no Galpão Ladeira das Artes e teve dinâmicas artísticas, música, bar e gastronomia. A intenção era representar artisticamente histórias de mulheres que passaram pelo processo de mastectomia, apoiando a luta contra o câncer de mama através de uma conscientização de diferentes públicos sobre o tema, incentivando o diálogo e integrando arte e informação. As obras vendidas terão 100% do valor destinado à Associação Amigas Cleia Beduschi. Cada artista convidado recebeu uma história e a partir dela ficou livre para criar e se expressar como bem entendeu, criando sua obra sobre a plataforma de sua preferência.
Artistas Convidados
Tudix - Mônica Savi - Driin - Thiago Valdi - Bya Brasil - Hanna Lucatelli - Juliana Odett - Nath Araújo - Larissa Jennings - Nina Fontenelle - Bruna Andrade - Fernando Schlaepfer - Pedro Gomes - Luiza Potyr - Camilla Siren - Bruna Soares - Maria Clara Guimarães.
Quem quiser conferir cada obra e relato pode acessar diretamente clicando aqui ;)
Aproveitamos para conversar com alguns artistas e entender mais sobre a experiência para cada um e como foi o processo de criação da obra.
Luiza Potyr
Quando se fala de Outubro Rosa, sobre o câncer de mama, sobre o exame de toque, das mulheres terem que se tocar, se conhecer... eu acho que existe um tabu já de muito tempo na sociedade, ainda mais sobre o toque da mulher nela mesma e o conhecimento do corpo dela. Eu acho que a galera mais jovem, da nossa faixa etária, tem desconstruído muito isso nos últimos tempos, então foi muito bom poder entrar mais nesse tema, que também é um tema que eu abordo sempre nas minhas ilustrações, como o que eu fiz na minha obra para esse projeto. Fiz um bordado sobre o toque da mulher nela mesma, sempre pegando a figura feminina, nua, como uma forma de se aceitar. Eu acho que é muito interessante um projeto com pessoas jovens em um assunto que é falado por um público mais velho geralmente, já que esse tipo de câncer não atinge tanto pessoas da nossa idade, então juntar esses dois meios que se distanciaram é muito legal. Conseguir fazer um projeto que seja atemporal como esse é muito bom, fico muito feliz de poder participar e aprender mais sobre o tema.
Cada um dos artistas recebeu um relato e a gente se baseou nisso para fazer as artes. No meu relato a Aidê dizia que quando recebeu o diagnóstico do câncer era como se estivessem falando de outra pessoa. Eu acho que isso acontece muito no nosso dia a dia. Tanto para o lado bom como ruim, as vezes a gente acha que aquilo não é da gente. Então eu tentei passar esse lado, como de um alter ego da mulher no meu bordado. Eu trouxe um pouco dos meus traços em um trabalho completamente manual. No meu relato ela disse que faz trabalhos manuais então eu tentei associar uma coisa que eu já fazia e gosto muito de fazer com uma coisa que ela disse que trouxe ela de volta para a vida. Que fez ela se enxergar de novo. Acho que isso se aproximou muito, tanto do projeto do Café Rosa quanto da minha obra.
Pedro Gomes
Para a exposição Relato Rosa eu realizei uma pintura retratando a história da Dr Sabrina, onde o pai dela que sofreu o câncer e ela diz o quanto é importante pessoas estarem em volta do paciente tentando animar e ser humano, não tratar a pessoa doente como se fosse mais um doente. É sempre você estar alí, criar raízes e ser alguém família, alguém que tá ajudando a pessoa sempre e tratando com amor e carinho.
Tudix
A exposição parte do projeto Café Rosa e foi um diferencial esse ano pois ano passado a gente só ficou com o lance das tatuagens mesmo. Trazendo a exposição a gente quis abranger mais pessoas que não fossem só do estúdio e levar essa mensagem além do estúdio para um público geral, para clientes, amigos, familiares etc. A intenção do projeto e da expo é fazer esse link da arte com informação. Muita gente já passou ou tem algum caso de câncer na família e o câncer de mama é o câncer que mais atinge as mulheres no mundo inteiro. Eu acho que a gente tem que ter empatia nisso. É um assunto muito perto só que nem sempre a gente tá informado.
A arte por si já é legal, mas quando colocamos um tema, alguma referência, a história de uma pessoa, acho que fica lindo porque as duas se complementam, então mesmo com a maioria dos artistas não conhecendo as mulheres que eles interpretaram eles tiveram essa troca e puderam saber mais sobre uma pessoa, sobre uma história, se sensibilizar, se deixar tocar por esse assunto. A partir disso cada um criou a obra do jeito que achou melhor.
Eu interpretei o texto da Liza Guedes, que foi o texto que mais me tocou durante o projeto inteiro. Eu tatuei ela ano passado em Florianópolis e decidi interpretar a obra dela porque foi através desse relato que a gente teve a ideia de fazer a exposição coletiva, a parada tocou a gente tanto que queríamos compartilhar isso com as pessoas. Acho que se for só a tatuagem fica muito restrito. Fazendo a exposição a gente vai gerar isso tudo, trazer mais pessoas… Eu pensei no relato dela no lance de florescer, da transformação, de brotar… Depois eu a conheci e virei muito amigo dela então tem várias facetas. Ela me disse que depois do câncer virou outra pessoa, o mundo fez sentido e isso me tocou muito. Fiquei muito com isso na cabeça.
Maria Clara
Eu passei muitos dias tentando interpretar o meu relato de uma forma não tão óbvia e acabei indo por um lado onde eu não abordava o pós, mas sim esse processo da doença, as partes ruins. Meu quadro aborda as limitações que a doença traz, que deixa a pessoa completamente debilitada por causa das quimios, por causa das radios… Acho que através de uma metáfora é como se fosse a gestação. É um processo de gestação dela para uma nova vida após a doença, encarar a vida de uma nova forma. Ela fala que tudo depois da doença ficou mais leve, então acho que o quadro fala sobre esse processo de transformação interna dela. Um processo solitário, mesmo que você tenha uma rede de apoio muito boa ainda assim é você e sua doença, como você lida com ela, como você encara. E principalmente depois, que foi essa mudança na vida dela, que fez ela encarar a vida de uma outra forma completamente.
João Ramil
Sobre a concepção do Café rosa, eu acho que ele nasce de uma vontade tanto do Café como da Fenda de ter um impacto cultural fora da nossa zona de conforto. A gente pensou em como poderíamos atuar mais socialmente e por algumas iniciativas que já tinhamos visto de outros estúdios. Acreditamos que poderíamos também contribuir nessa luta do câncer de mama, que é uma luta muito forte, então buscamos dentro da gente como a nossa própria arte, a nossa própria linguagem poderia de fato somar na vida de uma pessoa. Quando veio essa ideia pra gente foi nítido que era por aí que poderíamos seguir, dando esse primeiro passo. É o segundo ano agora, primeiro ano a gente conseguiu fazer só em Floripa, agora segundo ano também entrou o Rio e ainda tendo contato com outros estúdios do Brasil para participar. Espero que ano que vem a gente possa continuar crescendo e ajudando mais gente.
O que eu gostei muito, como FENDA, de encontrar no Café, foi uma abertura para usar a arte de uma forma não puramente estética, mas como meio de transporte pra gente chegar em outros lugares, que nem foi o Café Preto pra Viagem, por exemplo. Pelo estudo da Fenda, pela metodologia e todo o nosso pensamento, a gente acredita muito na função social da arte, que é a arte trazendo uma reflexão sobre o mundo que a gente tá vivendo, sobre como a gente poderia ter um mundo mais colorido, mais harmônico. Encontrar o Café Preto com pessoas com tanto talento e tanto potencial e abertos para fazer isso foi o que fez o projeto acontecer. Ver uma galera tão nova se mobilizando dessa forma em diferentes cidades para realmente usar a arte como função social é o grande objetivo e a grande essência do Café Rosa.
Hanna Lucatelli
Eu fico muito feliz em ter sido chamada para participar desse projeto, em pensar na concepção dele desde o começo, sendo chamada por amigos que eu gosto muito e me sinto muito à vontade para criar e pensar junto em projetos e principalmente para um olhar que na grande maioria é sobre o feminino, sobre o cuidado da mulher com ela mesma. Eu achei um projeto muito sensível, pra gente parar um pouco essa correria toda que a gente fica, sempre na nossa bolha, com as pessoas que a gente convive, para poder olhar para uma parcela de mulheres um pouco diferentes, para histórias diferentes. Eu venho de um processo de criação quase que industrial, estou num processo de criação de encomendas e foi muito bom parar pra pensar e criar a partir de uma narrativa e tentar mudar um pouco o meu ponto de vista, tentar mudar um pouco a história que eu tava contando nos últimos tempos em telas e nas paredes.
Eu recebi o relato e era um relato sucinto. Eu achei ele muito forte mas ao mesmo tempo muito leve, me passou uma mulher que viu a doença quase como uma benção, como um presente, por ela começar a olhar a vida dela de uma outra forma. Uma mulher muito grata pela vida que parece pra mim entender a vida como um presente e que isso foi só um percalço, que ela já ta feliz por tá viva, sabe? Uma mulher enfermeira, que cura, e que se viu num momento de auto cura. Uma mulher de muita fé, que parece que se alimenta da fé e com essa fé ela cura o outro, mas nesse momento ela se curou. E foi a partir desse pensamento que eu concebi a minha tela, com muito cuidado e com muito carinho, muita empatia e admiração por uma mulher que trata de um assunto tão complicado de uma forma tão leve. Eu tenho um mantra de vida que é Entrego, Confio, Recebo e Agradeço. Ela me pareceu muito isso, ela é muito grata pela vida que tem e pelas coisas que aconteceram, não vê o ruim como ruim, ela agradece porque ela começou a ver a vida de uma outra forma, amando e sendo muito amada.
Fernando Schlaepfer
Eu acho muito foda e muito importante esse rolê do Café, esse ano envolvendo mais pessoas e mais mulheres. A tatuagem tem uma relação muito direta com o papo do câncer de mama. Direta e indireta. Tem o lance de mulheres que fazem a mastectomia tatuarem o mamilo ali por cima. A tatuagem por si só já é algo que envolve a auto estima e nesse caso não tem nem o que falar, né, é óbvio, é muito importante e muito bonito, muitas pessoas que estão participando deste projeto fazem isso, em paralelo e tal, independente da relação com o Café ou não. Eu acho que o forte dessa campanha é o esclarecimento sobre o câncer de mama e a prevenção. É do caralho você fazer qualquer coisa que possa levantar um dinheiro pras instituições e aqui rolou a venda de obras, camisas e tudo mais. E só de você falar sobre já é incentivar as pessoas a saber mais sobre o assunto, principalmente mulheres, óbvio.
Talvez para mim tenha sido um pouco diferente, não só porque eu fui o único que fez fotografia mas também porque eu participei desde o papo com as mulheres até a execução das fotos, então foi uma coisa mais direta. A gente se encontrou com as senhoras, trocou uma ideia com a Maria e a Madalena, ouviu a relação delas com o câncer, ambas passaram e venceram a doença, operaram e estão super positivas e de bem com a vida, definitivamente. Eu quis fotografá-las na vibe que elas estão, usando rosa como tema mas fazendo algo tipo um fashion shooting. Juntamos com o pessoal da Cartel e fizemos uma produção de moda com elas, montamos um cenário.. então foi um trabalho em conjunto com pessoas que também tem uma relação com o Café. Teve a Bya fazendo contato direto com as mulheres, a Fernanda entrevistando, a Ju Diniz do Cartel produzindo, o Tudix também colou junto. Foi do caralho todo mundo estar envolvido em todos os processos, ali junto se emocionando com as mulheres e depois se divertindo fazendo duas senhoras beirando os 80 anos pela primeira vez sendo fotografadas como modelos e elas pirando nisso. Elas amaram o resultado e isso foi muito importante pra gente. Óbvio que elas tem as questões delas como qualquer pessoa e também pelo fato delas terem passado por isso, é uma cirurgia muito violenta, muito radical. Elas se sentirem bem com isso é muito importante e fazer uma pequena parte disso é do caralho. É legal que é um caminho que se destrincha em alguns processos: a conversa, a foto, a exposição, em como isso reverbera nas redes sociais… É um trampo muito maneiro chegar aqui e ver tudo isso acontecer, um monte de gente colando, um monte de obras lindas… é bem do caralho e muito importante!
Veja também o vídeo de um pouco do que rolou no evento!
Créditos:
Matéria: Bruno Brasil / Leonardo Guimarães
Fotos: Caio Humb
Vìdeo / Gifs: Leonardo Guimarães