Calmo é o mood, Calmob é good
A galera de Volta Redonda que exporta sua estética visual e sonora
Publicado em 11/2018
Konai, Banal, Rancho Mont Gomer, Posse Cutz e Calmob, são alguns dos nomes que tem figurado na cena lo-fi do braza. Uma parcela da galera não tá ligada neles, mas o corre tá sendo feito.
Ao mesmo tempo, tenho certeza que já parou em algum momento para ouvir uma das inúmeras playlists de lo-fi que existem no Youtube ou já ouviu Makalister - lembrado pela linha que fez no primeiro vídeo do Poetas no Topo, “o reflexo vira matéria”, que virou até nome de página de memes. Pois bem, o lo-fi está se tornando o novo fenômeno do underground mundial, apesar de já existir há algum tempo
A Calmob não se pretendia um coletivo, simplesmente aconteceu, assim como esse hype em cima do lo-fi. Hoje ela é composta por Raqui, Comédia, Bea, Cotonete, Dabel, Sedex, lvks, Peagá, DC, GVTX, Sh1ft, Nap, Bowl, Magro, Kethy e Louise, gente bagarai reunida através do propósito de se expressar não só pelo som, mas por tudo que compõe esse lifestyle. Quatro dos integrantes brotaram no Rio e aproveitei pra desenrolar.
Começamos discutindo sobre o próprio nome do coletivo, da onde surgiu e tal. DC disse, “Pô, nós sempre tivemos um rolé de falar pro outro: ‘calmo’, ‘tá calmo’, tipo gíria. Fora que a gente busca se manter na calmaria mesmo, sem ir atrás de energia errada. Daí, a gente também sempre curtiu os Bloods, a forma que os caras se expressam e rolou que a gente sacou que Calmo e Mob se encaixam perfeitamente; era a conexão através do “mo”. Ficou Calmob, foi isso. E aí, como a gente foi se entendendo conceitualmente, jogamos um Snorlax como símbolo e mascote do coletivo”.
Essa geração não é sad, existem muitas diferenças, como estar ligada às estéticas 80s e 90s, por exemplo. São formas diferentes de olhar e produzir arte, que passa pela moda, pela forma de escrita, comportamento, temáticas e visuais. De fato, é uma Cultura completa, e assim como toda Cultura nascida pós-internet, tem o poder de se misturar e se acoplar em outras Culturas - o que vem produzindo alguns mal-entendidos na compreensão geral do que ela se propõe. “Muita gente trata o lo-fi como se fosse um gênero musical, o que ele não é. Pô, lo-fi diz muito sobre que elementos você escolhe pra trabalhar em cima de um som, das roupas que tu veste, dos desenhos, colagens e vídeos que tu produz”, desenrola Peagá.
“Boto fé até que essas playlists do Youtube e Spotify são tipo os DVDs Hip-Hop Videotraxx dos anos 2000. A galera começou a chamar o Rap, que é um elemento da Cultura Hip-Hop, de Hip-Hop, como se a Cultura se resumisse no som, mas não é nada disso. A mesma coisa com o lo-fi agora, se for parar pra pensar… Lo-fi é Cultura e potencializa a gente a criar novos gêneros, conversando com o Jazz, o Rap, House e outros…”, completa DC.
Sedex passou a visão também, “Mano, tem muito a ver com defender uma estética que parece não ter qualidade, como o próprio nome diz, mas na real, tem e muito! Um bom exemplo foi quando fiz o clipe do remix da Sobre-Preço com o Lucas Negrelli, de SP. A gente utilizou bons equipamentos e o conceito era me seguir de costas, a partir disso, na edição a gente deixou com a nossa identidade”.
Não só pela proliferação dessas playlists, mas também por canais como o “Quadro Em Branco” ter citado o lo-fi e dentro disso falar da Calmob, por conta da faixa “Mônica”, o coletivo vem avançando na construção da sua base de público. Peagá e Bowl contam que “foi um marco a gente ter sido citado pelo Quadro Em Branco, isso atraiu a atenção da galera pra gente como um todo, o que tem possibilitado todos lançarmos trabalhos e ao mesmo tempo construir uma relação massa pra experimentar outros projetos. As mina tão puxando uma pegada de slow fashion e misturando colagem analógica com inserções digitais, tem um mundo sendo explorado que representa o ser lo-fi.”
Ao mesmo tempo, pela própria proposta e conceito, eles acreditam que isso aponte para um formato diferente de relação do público com os artistas, inclusive que o núcleo sejam os próprios artistas e criadores da cena que são hiperconectados e lançam projetos colaborativos diversos, mesmo às vezes, nunca tendo se conhecido fisicamente. O que revela uma característica forte apontada por DC, “Cara, a gente tem uma relação muito firme com a internet assim como vive a rua, pode crer? Mas a internet realmente fortalece muito, principalmente pros beatmakers. Somos uma rede enorme, mesmo tendo altas diferenças conceituais, visuais e até sonoras…”
Eles investem em ter uma maior liberdade criativa pra continuar impulsionando a parada sem grandes intenções aparentes, mas atingindo quem chama a responsa pra si.
“A gente não acredita muito em número apesar de querer que os sons tenham views, mesmo assim, por fazermos tudo independente, vamos tocando e lançando as paradas de forma orgânica, pode crer? Isso é uma característica que eu também acho bem nossa, da cena. Pensar que isso ainda assim tem feito a gente produzir collabs com manos da gringa, tipo Drae Da Skimask e Soudiere da França, é muito foda”, conta Bowl.
Chegamos num ponto do papo que eles todos disseram basicamente o seguinte com frases conectadas, “todo mundo aqui tem um segundo corre. Um trampa em metalúrgica, outro em loja de celular e por aí vai… Usamos isso pra impulsionar o coletivo, pra irmos a outros lugares e subverter a nossa própria arte. Quanto mais a gente caminha se preocupando em questionar as coisas, melhor, manja?”
Planejar e testar também compõe o modus operandi da Calmob. Eles investem tempo em se organizar pra lançar projetos e trampos novos, como é o caso do primeiro disco solo do DC, que virá com diversas referências diferentes do que quem acompanha tá ligado. “Tá sendo um álbum trabalhado a muitas mãos, com participações de amigos de várias partes do país. Quero que seja um som que chegue a mais pessoas, da forma certa, corrigindo a visão do que é o lo-fi”, conta.
Pelo visto, a cena tá respirando com saúde. A visão e fé dos manos aponta pra “expansão de festas e rolés voltados pra slow fashion, artes visuais e gráficas, MCs e produtores musicais que misturem tudo e movimentem mais gente. Se tiverem mais eventos acontecendo mais galera pode colar. Em breve vamos lançar um projeto sobre na pista.”
Volta Redonda é logo ali e tá fincada no mapa. Agora cola no canal de Youtube e no Instagram da Calmob e descobre mais sobre os caras. Recomendo botar “Seu Jorge Vol. 1” do Anti-Herói, dupla do Peagá com GVTX, como trilha sonora pra essa navegação.