Trocando uma ideia com Stromae
O belga que adora Romário e 'Beijinho no ombro'
Publicado em 03/2015
O nome Stromae pode não ser muito familiar pra você, mas tenho certeza que aquela música Alors on Danse já embalou muitas reboladinhas por aí. Pois ele é o músico belga por detrás dela e aterrissou no Brasil essa semana para se apresentar no festival Back2Black, nesse sábado (21), e no Audio Club, em São Paulo, neste domingo (22). O cara, que completou 30 anos na semana passada, é um dos maiores nomes da música na Europa e, acredite, super tímido e discreto.
Nascido Paul Van Haver, é filho de mãe belga e pai ruandês (com quem teve pouco contato até a morte dele, em uma guerra em Ruanda, em 1994) e se disfarça sob o codinome Stromae - uma brincadeira de inversão de sílabas com a palavra “maestro” em francês. Em uma entrevista recente, ele disse que Paul é o cara discreto e mais fechado, tímido até, enquanto Stromae é o personagem expansivo, que usa roupas supercoloridas e estampadas (da marca própria, Mosaert, outra brincadeira com as palavras “maestro” e “Stromae”). Até agora não sei direito se conversei com o Paul ou com Stromae, na sexta-feira, no quarto de um apart hotel na Barra da Tijuca. A certeza que ficou é a de que ele é um cara muito carismático, simples e simpático – nem me venha com papinho de que europeus, principalmente os que falam francês, são frios.
Ele escolheu uma camisa polo estampada verde e bermuda amarela da marca própria para o encontro com jornalistas, mas garante que não foi proposital. Antes de pisar aqui, Stromae já gostava muito da nossa música e musicalidade, além dos clichês: carnaval e futebol. Ele adora o Romário, aliás, e o hit “Beijinho no ombro”, da Valesca Popozuda. Gente como a gente, só que belga.
"Antes de chegar ao Brasil, já conhecia e gostava muito da batida da música de vocês, esse groove especial. Gosto da batida diferente entre a primeira e a terceira, entre a segunda e a quarta, me lembra a música nigeriana. Gosto do funk em geral, que tem muito desse ritmo e batida. Além disso, o idioma e o sotaque brasileiros têm uma melodia natural que acho interessante, independente do ritmo musical”, conta.
Tá, mas como conheceu “Beijinho no ombro”? Rindo e meio sem graça, ele explica: “Não lembro se foi meu irmão ou a namorada brasileira de um amigo que me mostrou a música. Gostei muito da batida, mas não entendo nada da letra”.
Além de Alors on Danse, Papaoutai é um dos maiores hits dele por aqui. Em tradução literal, o nome da música significa “Papai, onde está você?”. Saída do segundo álbum, Racine Carrée, lançado em 2013, a batida forte e contagiante da faixa quase não nos deixa perceber a letra densa e meio melancólica, até porque nem todo brasileiro entende francês.
“As crianças de 5 anos que entendem a letra não acham a música triste, os adultos acham. Acho que são os adultos que complicam demais as coisas, por isso a música pode ficar muito emocional, forte e densa. Especialmente quando se descobre que perdi o meu pai. Mas não era a minha intenção criar uma atmosfera triste”, conta Stromae, que costuma unir as batidas perfeitas para a pista com letras fortes, criando músicas que falam sobre racismo, câncer e até as dificuldades do dia-a-dia, como Alors on danse.
“Tenho músicas muito mais tristes do que Papaoutai, como Formidable, por exemplo, que talvez tenha mais raiva. Mesmo que você não entenda a letra, acho que é possível entender o sentimento que a música passa”, diz.
Formidable e Papaoutai, aliás, são ótimos exemplos da importância que o clipe tem para Stromae. O primeiro foi gravado com câmeras escondidas nas ruas de Bruxelas enquanto ele mesmo fingia estar bêbado e as pessoas pareciam não se importar, apesar de pararem para fotografar e filmar o artista supostamente embriagado. O segundo tem uma preocupação estética meticulosa e mostra um filho tentando conquistar a atenção de um pai imóvel, como um boneco. “Papaoutai mostra uma situação muito comum na vida real, é uma criança que faz de tudo para conquistar a atenção de um pai, que permanece imóvel”, explica. Por favor, assistam (Formidable aqui e Papaoutai aqui).
“Para mim, a música está em primeiro lugar e o vídeo, assim como a foto e o figurino, tudo o que é visual, vem logo atrás. É como se a música estivesse em nível 1 e a parte visual em nível 2, mas em uma escala de 100. Um é tão importante quanto o outro, claro que a música vem primeiro, mas não existe um sem o outro”, explica Stromae, que antes de dar o sinal para que o diretor comece as gravações, reúne produtores, produtores executivos, figurinistas e o próprio irmão em um brainstorm coletivo, do qual ele participa de todas as etapas.
A Mosaert, aliás, só reforça essa preocupação com a parte visual. Assim que a gente põe os olhos no lookbook, já consegue perceber como tudo na marca é redondinho, coerente e bem amarrado - e diretamente ligado à estética do clipe de Papaoutai. Uma mistura entre estampas geométricas digitais, estampas africanas e uma pitadinha vintage. As criações são assinadas pela estilista Coralie Barbier, que, by the way, é namorada de Stromae.
“Sou muito tímido, então minhas roupas são uma forma de quebrar isso. A roupa é para disfarçar a timidez. Às vezes preciso estar muito sério porque estou na frente de um público de milhares de pessoas e a roupa quebra isso. É uma forma de me comunicar e expressar as coisas”, afirma, com um sorrisinho no canto da boca.
Também ficou apaixonado pelas estampas da Mosaert? Então fica ligado que a partir desta terça (24/03), a loja online começa a entregar no mundo inteiro. E, se a gente torcer muito, rola uma loja aqui no Brasil. “Se for instalar a marca aqui no Brasil, abriria tipo uma loja só”, contou. Dedinhos cruzados.