O casamento vermelho de Letrux e Liniker
Cantoras celebraram o feminino em noite poderosa sob a lona do Circo Voador
Publicado em 11/2017
Tá na boca do povo e por todos os lados: a palavra é empoderamento - e suas derivações. “Todo poder às mulheres”, “É o poder, aceita que dói menos” e por aí vai. Mas como ver isso na frente dos nossos olhos? Como demonstrar, ao vivo e a cores, todo esse poder? Pra começar, convoque Letrux e Liniker. E a cor tem que ser vermelho - não por acaso, o tom que as cantoras escolheram para colorir o Circo Voador no show que fizeram em conjunto, na última sexta-feira (10).
Com os músicos da banda (e os amigos da plateia) uniformizados com a cor da paixão e antúrios vermelhos mil no pedestal do microfone, Leticia Letrux Novaes entrou no palco, com um dos maiôs feitos em parceria com a Aro Swimwear abraçando seu corpo e a boca cantando: “bota na tua cabeça que isso aqui vai render”. E, olha, como rendeu.
Quando Liniker apareceu, assim de supetão, pra uma participação nos versos do dueto em francês e português da música "Vai render", o Circo veio abaixo. Aliás, ela também usava vermelho, dos pés à cabeça, num conjuntinho de veludo molhado.
Mas voltando à Letícia, se o álbum “Letrux em Noite de Climão”, eleito o Melhor Disco do Ano, de acordo com o Superjúri do Prêmio Multishow, é bom de dançar pela casa com uns drinks na mão, imagine ao vivo, embalado por toda a energia da cantora, que dançou, pulou, se jogou - inclusive na plateia, tipo rockstar mesmo.
No setlist rolou muito mais do que as 11 faixas do álbum: teve manifestação musical contra o prefeito Marcelo Crivella, teve coro do Maior e Melhor Hit de 2017 e Todo o Sempre, “Toooooo-ma conta da sua viiiiiiiida”, e participação especialíssima de Duda Beat e Mãe Ana no coro e passinhos de “Que estrago”.
Letícia canta sobre o poder da mulher de vários jeitos: o do amor platônico que tem dois filhos, uma planta e um frango, os corações inteiros e partidos, estragos na casa e na cama e também sobre os dias em que a gente acorda pra perigo, sabendo que não vai “passar batida na festinha”. Quem nunca, né?
Depois de um ano em busca de um show de Liniker para cantar a plenos pulmões, conseguimos nos encontrar debaixo da lona do Circo Voador. No MECA Inhotim de 2016, vi e ouvi Liniker pela primeira vez. Saí de lá arrebatada e três dias depois já sabia cantar todas as músicas do disco “Remonta”. Ela veio ao Rio várias vezes neste ano, mas não consegui estar em nenhuma. Quero acreditar que é porque era pra ser debaixo da lona da Lapa.
Casa cheia, ingressos esgotados para ouvir de perto a voz poderosa que nos ensina a não pensar em gênero. E junto com ela vem uma banda incrível e um corpo que vai até o chão requebrando e até o meio da plateia para cantar “Prendedor de varal” junto com todo mundo - inclusive Letrux, que (re)apareceu pra festa.
Liniker é intensa, sensual, visceral, forte. É fazer charme quando quer, rebolar porque pode e ser política porque é necessário. Como ela mesma frisou, havia “uma travesti preta em cima do palco” e mais 2800 pessoas embaixo dele que a reverenciavam. E cantavam junto tão alto que quase abafavam sua voz - aquele coro estilo show do Los Hermanos.
Depois de tanto encanto, feitiço e envolvimento, na derradeira "Caeu" a galera não se aguentou e começou a subir no palco. Um, dois, três, quinze membros da Fila do Gargarejo Real Oficial lá no alto, dançando, cantando, pulando e depois reunidos no centro dele. Que nem brincadeira de ciranda, Liniker pediu para que todos se abaixassem e se apresentassem. Depois foi a vez do resto do Circo ficar baixinho, baixinho, só para explodir quando a mestre mandou. Haja poder para mandar em quase três mil pessoas, que obedeceram sorrindo e cantando.
Letrux e Liniker comandaram uma noite sobre o poder da mulher, o poder de toda e qualquer mulher.