Pussy Riot.
OS NOVOS RUMOS DA MÚSICA COMO INSTRUMENTO DE ATIVISMO
Publicado em 02/2020
É anunciada a vinda de Pussy Riot ao Brasil. No cartaz, uma figura de Bolsonaro composto por mosaicos que se encaixam entre barris de óleos, peixes mortos, latas de venenos, chamas e armas. Em cima, elas, as Pussy Riot’s em frente às cores da bandeira LGBT+ se levantando sobre a “cabeça-busto-desgoverno-monumento-vazia de ideias”, como descreveram na divulgação da apresentação.
A clara referência à tragédia ambiental do Nordeste, à liberação de centenas de agrotóxicos, queimadas na Amazônia, aos discursos de ódio contra a comunidade LGBT+ e à sanha armamentista do atual governo brasileiro, põe a público uma só voz: gritos de revolta.
A apresentação da banda pós-techno feminista russa aconteceu no último dia 30 de janeiro com participação especial de Linn da Quebrada no Festival Verão Sem Censura, no Centro Cultural de São Paulo organizado pela própria Prefeitura, acolhendo todas as manifestações culturais oprimidas em uma resposta à onda ultraconservadora que veio à tona com o bolsonarismo na tentativa de reprimir a arte e a cultura através do sufocamento econômico e da censura.
Linn, cantora trans que também teve seu show censurado pela Prefeitura de João Pessoa (PB) em setembro de 2019, alegou ser uma “orientação” da produção da organização da Parada LGBT+, acreditando que o discurso “muito pejorativo” da cantora seria a motivação do cancelamento de seu show.
Reunindo um público que se destaca de longe sendo sua grande maioria mulheres que se identificam com o discurso e a luta feminista e política que as Pussy Riot’s carregam, elas realmente foram pra “cantar, dançar e se revoltar” pela liberdade artística, de expressão e de equidade.
Vestidas ou não, o uniforme já estava preparado. As máscaras de balaclava sempre foram um símbolo de subversão e em um show desses, não seria diferente.
O grupo começou a difundir essa estética através do seu ativismo misturando arte e política em vídeos de performances, como a que aconteceu em 2012 em frente à Catedral de Moscou vestindo balaclavas para esconder a identidade enquanto cantavam uma “oração punk” intitulada “Maria mãe de Deus, tire Putin”. Foram condenadas a dois anos de prisão por “incitação ao ódio religioso”.
Mas afinal, o que o ativismo de Pussy Riot e o Brasil têm em comum?
“Bolsonaro e Putin querem criar nações fascistas”, disse Masha, integrante do coletivo russo em uma entrevista para Folha de São Paulo. Segundo ela, há muitas semelhanças entre Putin – no poder desde 2000 – e o atual presidente do Brasil.
Ela aponta que ambos têm origens conservadoras, militares e autoritárias, são machistas, sexistas e homofóbicos e acreditam na construção de uma grande nação, “o que na verdade é uma grande nação fascista”, disse ela.
Masha também conta que o governo Russo tem endurecido cada vez mais na perseguição política: “Prendem ativistas e pessoas que só estão por perto. E agora, as penas estão maiores. Temos redes sociais, só que, há pouco, passaram uma lei em que o governo pode derrubar sites internacionais, como o YouTube ou o Facebook. Eles ainda não usaram, mas podem facilmente fazer isso” diz. “Na Russia isso chegou longe. Aqui, talvez esteja começando”, completa.
A censura no Brasil sempre existiu mesmo após a redemocratização, ainda é um fantasma que paira sobre os meios de comunicação brasileiros. O fato é que desde que Bolsonaro assumiu o poder, a liberdade de expressão sofre riscos de ser inexistente. Em um curto espaço de tempo, inúmeros casos de proibição e restrição de circulação e venda de obras, músicas, diversos livros importantes brasileiros foram recolhidos de instituições educacionais e até condenação à prisão de humoristas e usuários de redes sociais aconteceram, sem contar as terríveis repressões policiais.
Em épocas de tensões políticas, é importante ressaltar a pluralidade de pensamento, a articulação de diferentes argumentações e raciocínios que conduzem à contestação e sintetizam as visões de mundo em um debate plural e saudável. A conscientização da sociedade sobre a gravidade e os riscos de ter seu direito de expressão cerceado ou tolhido completamente, é uma ação de grande consideração em tempos sombrios como estes.