A Ventre acabou, mas a arte fica
Um papo com Larissa Conforto sobre o último show da banda, no Lollapalooza, e o que vem por aí
Publicado em 03/2018
A Ventre acabou. Ou melhor, entrou num período de hiato por tempo indeterminado, como o pessoal de música gosta de falar - até porque a gente não sabe o que o futuro nos reserva, olha os Backstreet Boys aí. Mas antes de tocar os últimos acordes ao vivo, a banda fez um show incrível na manhã de sábado do Lollapalooza e deixará como lembrança o EP "Saudade (o corte 切り)", a ser lançado em breve.
Para saber mais sobre os sentimentos que tomam conta do trio nesta despedida e também as novidades que virão, conversamos com Larissa Conforto, baterista da Ventre. No palco Onix do Lolla, ao lado dos companheiros Gabriel Ventura e Hugo Noguchi, Larissa emanava uma força tão poderosa que até ficava sem fôlego e quebrou a bateria quebrada no final, tamanha emoção e carga positiva que tomava conta dela - vai ver foi a força de Iansã, que ela homenageou com o figurino escolhido.
Você tá mais uma vez no Lolla (a primeira foi com Tipo Uísque, em 2012), no último show da Ventre e eu fiquei impressionada com você sem voz de tanta energia colocada na bateria. O que passou na sua cabeça antes, durante e depois desse show? Nossa, muita coisa! Pra mim cada show é uma experiência única e intensa por si só. Eu vejo a música como um canal de comunicação e expressão transcendental, sabe? Ela lida com os sentidos mais profundos do ser, muito além da audição. Por isso subir em um palco é uma grande responsabilidade pra mim. Num tempo de tanto ódio, a gente tende a esquecer do afeto. Mas Arte é resistência e tá na essência. Só ela conecta milhares de pessoas de origens e vivências diferentes na mesma frequência. Uma experiência emocional compartilhada, isso é gigante, é muito poderoso!
Por isso eu me concentro pra dar tudo de mim nos shows, imergir mesmo. Mas o dia era muito especial: minha segunda vez em um palco no Lollapalooza e segunda vez que esta experiência deságua à margens do nunca esperado FIM - que significa recomeço, claro, mas não deixa de conter uma despedida saudosa. A gente construiu o show baseado nessa ideia de Saudade, que é o título do EP de quatro músicas vindo aí. Então, apresentamos as músicas como pinceladas na memória, um pouco desconfiguradas, com fotos das turnês sendo desconstruídas, despedaçadas. Imagina a intensidade disso pra gente? Foram cinco anos de muito trabalho, muito amor. Impossível não transparecer, né?
Sábado eu errei como nunca, improvisei como nunca, brinquei como nunca, sorri como nunca. Tudo como precisava ser. Esqueci falas, perdi a voz, engasguei, engoli seco... Muitas emoções em 35 minutos. Olhei pra cada pessoa ali disposta e tão cedo no sol, cantando as músicas, prestando atenção, se conectando. Me veio a certeza de que esse é o caminho, razão e causa. Como se a correnteza fosse maior que o Rio, como se esse fosse o caos necessário pras coisas mudarem.
Depois do show foi só alegria! Muito carinho recebido, sensação de missão cumprida, novas janelas abertas e muitas aventuras pela frente! Foi um dia de aprendizado intenso, que eu vou guardar pra vida toda.
O seu figurino era uma referência a Iansã, por que o escolheu pra esse show? Epahey Oya! Iansã é a deusa dos relâmpagos, da espada de fogo, dona da paixão. Rainha dos raios, dos furacões e tempestades. Mãe dos eguns, guia dos espíritos desencarnados, senhora do cemitério. Guerreira, lutadora da justiça e da verdade crua. Altamente passional e furiosa, é a chama do caos que provoca a mudança. A coragem. A intensidade. Iansã é força. É Luz que de tanto iluminar, queima.
Não tem representação mais fiel do que eu sou e sinto no momento presente. Ainda mais depois dos últimos acontecimentos no Rio... Achei digno trazer essa memória e homenagem, num momento como esse. E ela agradeceu...
Quando o show acabou, vi várias fãs chorando de soluçar porque era o último show da banda. Para acalmá-las, o que fica para os fãs durante esse hiato? Nada é pra sempre nessa vida, exceto o carinho e o amor trocado em momentos difíceis, e a Arte. Nunca é o fim. Mesmo a morte, não é ponto final. É sempre outro começo, uma porta pra novos aprendizados!
Se a gente chegou junto até aqui, juntos sairemos daqui! E seguiremos juntos cada uma o seu caminho! É importante que a gente respeite e compreenda as diferentes formas de caminhar, pra poder andar junto. Nada é por acaso! Coisa boas virão, e a gente vai poder sentir tudo diferente. Olha que lindo! Vamos celebrar o que passou, e esperar os novos ventos!
GRATIDÃO IMENSA por todo apoio, toda troca, todo amor. Estaremos sempre juntes, enquanto nos reconhecermos como iguais! Vocês me ensinaram tanto sobre a vida, que o mínimo que eu faço é agradecer e me dispor a estar presente! Nada vai mudar afinal! Essa é a vida!
Seguiremos firmes <3
Ficamos sabendo que você tá gravando um disco solo... Fala mais disso aí, não deixa a gente na curiosidade! Eu sou do time das bandas, sempre. Foi assim que aprendi a fazer música e é no processo conjunto que eu acredito. Já diriam meus conterrâneos do Forfun: "alegria compartilhada é alegria redobrada". Mas nessa caminhada eu me vi muito só. Então,, senti que chegou a hora de transformar a solidão em solitude. Botar pra fora outras coisas, de um jeito novo pra mim, e contar com amigxs para transformar em coisa boa.
Comecei a juntar os caquinhos das coisas que escrevo e crio pra transformar em um álbum. Por enquanto é isso... Tudo muito inédito. Tenho a certeza que contarei com colaborações de um monte de gente que cruzou meu caminho nas estradas da música. Tô ansiosa pra ouvir o resultado, tenho o conceito muito claro na cabeça, todas as direções. Agora é concentrar e realizar.
Pra quem quiser ouvir a prévia e talvez matar a saudade, estou levando agora uma turnê de dois meses, entre julho e setembro, com o Vitor Brauer. A idéia é viajar o Brasil de norte a sul, inteirinho mesmo, tocando em duo as músicas da Ventre, Lupe de Lupe, Xóõ, Desgraça, do projeto solo dele e também algumas minhas. Vou levar a SPD (samplepad, que mudou minha vida), e a idéia é fazer uns loops pra poder brincar em cima. Serão versões fervorosas das músicas que a gente ama e ponto. Vai ser bem bonito :}