Exploradores urbanos unidos: a cidade é nossa religião
Nos bastidores da campanha de NikeLab ACG, um papo com mestres em viver e redescobrir metrópoles
Publicado em 06/2017
Na nossa pasta de hits favoritos da pista de dança, está “Midnight city”, da banda francesa M83. Além da indefectível batida, a estrofe que fica semanas ecoando na nossa cabeça diz: “City is my church” (“A cidade é minha igreja”, em tradução livre). Além de ser chiclete, ela consegue definir em quatro palavras o lifestyle de uma galera – inclusive o nosso. Como fiéis incontestáveis da cidade que somos, a Nike nos convidou para produzir nada menos que a campanha da nova coleção de NikeLab ACG, que acabou de chegar ao Brasil.
ACG é a sigla para “All conditions gear”, (“equipamento para todas as condições”, em tradução livre) e consegue definir bem quais são as melhores ocasiões para usar as peças: qualquer uma. De verdade. A coleção foi criada em parceria com Errolson Hugh, fundador da marca alemã Acronym, e tem desde poncho feito com tecido que repele água e pode ser dobrado até caber no bolso da sua calça a tênis que é fechado apenas puxando um cordão. O futuro já chegou, amigos.
Na frente das nossas lentes, estava um time de profissionais quando o assunto é explorar a cidade: o rapper Rincon Sapiência, o diretor criativo da Cotton Project Rafael Varandas, o empresário Facundo Guerra, que comanda vários dos espaços mais legais da noite de São Paulo, e o nosso Raul Aragão, que é capaz de explorar qualquer cidade em que você o largar - é impressionante.
Enquanto circulávamos com o quarteto por alguns dos pontos mais emblemáticos de São Paulo, tipo o viaduto do Chá e o Copan, fomos conversando sobre o que define um explorador urbano. A opinião unânime acredita que esse é um título dado a quem é curioso e sempre consegue enxergar o cenário urbano de um jeito diferente, e Rincon foi além: “Para mim, ser um explorador urbano é estar na rua. Tem muitas coisas de cultura urbana, que podemos ler sobre as referências, seja o grafite, as roupas, o comportamento ou as gírias, mas se não estivermos na rua, não conseguimos entender de fato como funcionam. Ver os grafites a olho nu é diferente de acompanhar numa exposição ou numa revista, ver as pessoas vestindo algo é diferente de acompanhar pela internet, ver o diálogo das pessoas, ver o universo urbano sem estar presente na rua não faz tanto sentido, né?”.
Esse relacionamento sério com a rua tem contato, não é um namoro virtual, e nos deixa mais expostos a diversas locações e condições, sem barreiras e sem filtro, tipo um rolê de moto – coisa que, aliás, Facundo adora fazer. Os espaços perfeitos para abrir alguns de seus empreendimentos mais icônicos, como o Cine Joia, o Lions e o Riviera, ele descobriu andando de moto por São Paulo. Apaixonado por arquitetura, o empresário está sempre observando as construções por onde passa e, vira e mexe, algumas delas viram empreendimentos.
“Legal é encontrar coisas que nunca tinha reparado em caminhos que já trilhei muitas vezes. Eu acho que o fato de hoje tirarmos fotos para postar em nossas redes sociais fez com que a gente tentasse reparar nos ângulos de nossa arquitetura, que nos deslumbrássemos com a feiura, que nos esforçássemos para fazer do feio, belo”, afirma o argentino, que é apaixonado pelo centro da cidade. “Esse é meu território: a junção do clássico, do abandonado, do sujo, do contemporâneo, tudo isso me deixa louco. Acho bonito pra cacete.”
Varandas engrossa esse coro. Morador da região entre Santa Cecília e Higienópolis desde os sete anos de idade, o diretor criativo afirma que essa mistura, que está sempre em mutação, é inspiradora: “Acho que é um cenário perfeito pra criar coisas de fato fora da curva. Isso realmente diferencia a cidade de São Paulo de outras cidades do mundo que, às vezes, possuem lugares mais bonitos, mas, de certa forma, são mais pasteurizadas”.
A escolha de São Paulo como cenário para a campanha não foi feita por acaso. A cidade consegue reunir em 24h uns três climas diferentes (sem exagero), o teste perfeito para a coleção de NikeLab feita para “todas as condições”. Faz parte da rotina dos paulistanos dar uma checada na previsão do tempo antes de sair de casa e se preparar para o que o dia reserva.
Facundo carrega tudo o que precisa em uma mochila impermeável: chaves, celular, uma muda de roupa e uma carteira tipo clipe de dinheiro, que se converte em um canivete (ele ama facas). Varandas também não leva nada além do necessário e sempre se preocupa com o peso da roupa que vai vestir - e, talvez, carregar depois. “Acho que esses são os pontos principais: o peso da roupa e o fato dela ser realmente essencial para aquela situação. Então, acho que principalmente as jaquetas dobráveis da linha NikeLab ACG são muito práticas, porque você pode usar de manhã e no meio do dia simplesmente dobrá-la e carregar como uma bolsa”, comenta. E você já deve ter percebido pelas fotos de Rincon que ele pensa cada detalhe de seus looks. Como está sempre na rua, mesmo quando suas referências são mais clássicas e elegantes, ele adapta as roupas ao estilo urbano, porque poder circular com leveza pela cidade é imprescindível. Por todos esses motivos, os companheiros inseparáveis do trio são, claro, os tênis.
No caso do Raul, o único carioca-nascido-em-Recife do grupo, essa atenção às várias condições climáticas é mais presente na hora de montar uma mala de viagem – coisa que o fotógrafo precisa fazer quase semanalmente. “Peças funcionais passaram a ser itens fundamentais em toda mala que eu preparo. Considerando que já ocupo muito do meu espaço com equipamento, sobra pouco espaço para levar opções de roupa. Capas de chuva ou botas, por exemplo, precisaram ser dispensadas. Casacos e tênis precisam ser weatherproof e, de preferência, também serem usados durante corridas ou treinos”, conta. Tá explicado porque ele ficou tão apaixonado pelo poncho impermeável da coleção, que é levinho, tem bolso interno e fechamento com ímãs.
Antes do fim das fotos e da filmagem, pedimos para cada um deles contar quais são os lugares mais incríveis em suas respectivas cidades e, de quebra, montar um mini roteiro para você usar na próxima viagem, com o selo de qualidade e curadoria de verdadeiros exploradores urbanos. Anota tudo, hein?
Rincon Sapiência, rapper. São Paulo.
- Quais espaços e cenas urbanas você mais curte explorar? Por quê?
Eu tento fazer um equilíbrio. Acho que a periferia tem um universo muito particular, que vai do futebol de várzea aos carros tocando músicas em alto volume - e você acaba descobrindo o que tá tocando, o que tá acontecendo -, vai do funk ao arrocha, passando pelo samba. Gosto muito de alguns lugares do centro da cidade, os brechós, os lugares que tocam músicas, as festas, os encontros de dança, de grafite, de exposição... Muitas dessas coisas poderiam acontecer mais pela periferia também, mas, infelizmente, acabam acontecendo mais nas regiões centrais. Eu tento fazer um equilíbrio dos dois espaços, estar bastante presente no centro de São Paulo e, ao mesmo tempo, não me desconectar da periferia, porque lá é, geralmente, onde rola o start das tendências de tudo. Gosto de estar ocupando os dois espaços.
- O que te encanta na sua cidade? Onde você se sente mais à vontade nela?
O ritmo da cidade. É muito saudável a gente estar presente numa área mais verde, mais arborizada, um bom ar, uma saúde mental... Enfim, tem uma série de coisas muito boas que a tranquilidade disponibiliza pra gente, mas, como eu trabalho com a arte e a nossa mente de artista não para um segundo, pra mim é interessante estar numa cidade que não dorme, onde tudo acontece a toda hora, onde eu posso comer no meu horário, que seja de madrugada, que eu possa me entreter em qualquer dia da semana e não somente no fim de semana, que o comércio feche tarde, e por aí vai. O que me encanta na cidade de São Paulo é o ritmo dela e como eu consigo me alimentar, principalmente artisticamente, 24 horas por dia, se eu quiser. Para mim, que trabalho com arte, com música, especificamente o rap, acho que é o melhor lugar pra respirar essa energia toda.
- Se você fosse levar a gente num tour por São Paulo, em quais lugares nos levaria?
Particularmente, gosto muito de apresentar meu bairro, a Cohab 1. Não moro mais lá atualmente, mas é onde eu tenho todas as minhas raízes estabelecidas, minhas amizades. Toda a minha formação de caráter, de tudo, foi na Cohab 1, durante mais de 20 anos que eu morei lá. Acho interessante que já conheci pessoas que vieram de fora do Brasil, por exemplo, se instalaram em algum lugar da região central - na Vila Mariana, no Centro, em Pinheiros - e tiraram conclusões sobre São Paulo: “Ah, é uma cidade assim e assado”. E eu falo: “São Pulo tem várias caras e você precisa conhecer as várias caras de São Paulo” - e uma delas é a periferia.
Então, quando eu levo esse pessoal pra Cohab, eles se encantam, eles falam: "uau". A interação, o futebol, os carros, o ritmo, as pessoas mais acolhedoras... Quando você não está na região central, não é aquele ritmo em que todo mundo está trabalhando, correndo atrás de dinheiro, e as pessoas se fecham mais por conta disso. Quando você está na periferia, as pessoas estão na sua área de convívio mesmo, residencial. Gosto de apresentar os bares, lanchonetes, pista de skate, campo e futebol de várzea, comida típica, bebidas típicas... É o que eu mais gosto de fazer. A Cohab 1 é um lugar que eu faria um tour com qualquer pessoa, se eu quiser impressioná-la e falar que São Paulo é um lugar legal, com certeza é pra lá que eu levaria.
Facundo Guerra, empresário. São Paulo.
- Quais espaços e cenas urbanas você mais curte explorar? Por quê?
Tenho uma certa preferência por explorar o centro da cidade, que eu ainda acho pouco utilizado, porque sempre foi uma região de uso funcional, utilizada pelos burocratas. A todo momento, se você usa a curiosidade e o olhar novo, essa região permite que você se deslumbre com ela. Eu gosto de tentar descobrir infraestruturas abandonadas, ir em horas em que nenhum outro humano se encontra nestes espaços, onde realmente dá pra se sentir sozinho numa megalópole. Vejo uma beleza angustiante nessa decadência paulistana, pra mim, é a primeira cidade do mundo que já está no pós-apocalipse.
- O que te encanta na sua cidade? Onde você se sente mais à vontade nela?
Eu acho que é a sua ambiguidade: a beleza e a feiura, ordem e caos, pobreza e riqueza, a falta de turistas, o picho e o grafite, fascistas e libertários, trânsito e bicicletas, centro e perifa, essas múltiplas realidades que disputam espaço palmo a palmo, quase numa guerra de trincheiras. São Paulo é um imenso campo de batalha, tanto do ponto concreto quanto simbólico. Não existe um lugar onde me sinta melhor em São Paulo: ela é incômoda. Essa é a beleza dela, ela nunca te pacifica o olhar, como Paris. Se você tá com o olhar adocicado, cê não tá em São Paulo. Se você prestar atenção em qualquer quadro, qualquer foto, vai notar algo estranho, uma assimetria, algo que não se encaixa na ideia clássica de belo. É aí que a ideia de um novo belo surge. Essa cidade é vida e morte, tudo junto e misturado.
- Se você fosse levar a gente num tour por São Paulo, em quais lugares nos levaria?
Um passeio à noite pela Florêncio de Abreu, talvez a última das ruas paulistanas com iluminação de mercúrio, um rolê pelas bordas da Cracolândia, pra não ver os dependentes químicos como zumbis, um concerto matinal na Sala São Paulo, o viaduto Santa Efigênia depois da meia noite, a capela dos aflitos, na Liberdade, o Museu do Crime, ali na USP, Minhocão pra ver a Companhia de Teatro Esparrama, uma peça no Teatro Oficina, a feira dos bolivianos, uma corrida de baratas no Museu Biológico, tirar um racha comigo na pista de autorama do modelódromo do Ibirapuera e andar no Minhocão de moto à noite, perto das 5 da manhã, que, apesar de ser absolutamente ilegal, eu não consigo resistir.
Raul Aragão, fotógrafo. Rio de Janeiro.
- Quais espaços e cenas urbanas você mais curte explorar? Por quê?
Tenho a sorte do meu trabalho me levar a conhecer novos lugares diariamente. Me interesso por lugares particulares com grande fluxo de pessoas. Por alguma razão, acredito que sempre é possível encontrar um novo olhar sobre lugares que “todo mundo já viu”.
- O que te encanta na sua cidade? Onde você se sente mais à vontade nela?
Amo esse contato eterno entre a natureza e o espaço urbano. Todas as paisagens estão misturadas e isso torna o Rio sempre incrível. Meu lugar favorito é a praia. Não conseguiria viver sem o contato do mar.
- Se você fosse levar a gente num tour pelo Rio, em quais lugares nos levaria?
Em qualquer lugar da cidade, mas BEM cedo. Minha nova paixão é explorar a cidade entre 4h30 e 6h, nada pode ser mais inspiracional.
Rafael Varandas, diretor criativo. São Paulo.
- Quais espaços e cenas urbanas você mais curte explorar? Por quê?
Eu curto explorar lugares que já existem e já têm uma repercussão e uma fama de serem bons centros culturais, bons parques ou bons centros gastronômicos, mas que, por alguma motivo da rotina ou um pré-conceito já criado pela cidade de São Paulo não são tão visitados. Existe uma infinidade de lugares que já existem, e são até bem acessíveis para as pessoas. Acho que esses são os lugares que, na minha lista infinita de coisas pra fazer em São Paulo, são os primeiros checks que eu gosto de dar e explorar.
- O que te encanta na sua cidade? Onde você se sente mais à vontade nela?
O que eu mais gosto de São Paulo é o high-low da cidade, a mistura entre coisas grandiosas e bonitas, e caras até, com todo um outro lado que é caótico, de certa forma feio, e até pobre. Acho que essa mistura é um cenário perfeito pra criar coisas realmente fora da curva e realmente diferenciam a cidade de São Paulo de outras cidades do mundo, que às vezes possuem lugares mais bonitos, mas, de certa forma, são mais pasteurizadas.
Levando isso em consideração, meu lugar favorito na cidade é, não o bairro em que eu nasci, mas o que eu cresci e onde eu vivo desde os sete anos de idade, que é a região entre Santa Cecília e Higienópolis. Acho que é um resumo bem interessante de São Paulo porque é uma região que tem desde o high de SP, que é uma arquitetura modernista, foi o primeiro bairro com saneamento básico, é bem arborizado, com influência de culturas judaicas, e ao mesmo tempo tem Santa Cecília, que é um bairro totalmente com cara de interior, com um monte de achados, de influências nordestinas e um monte de coisa nova acontecendo. Essa complexidade que é formada nessa microrregião é o que me agrada e eu me sinto muito confortável lá.
- Se você fosse levar a gente num tour por São Paulo, em quais lugares nos levaria?
Acredito que todo tour deve ser feito sob medida pra cada pessoa, mas, de uma forma mais genérica, acho que um bom tour por SP envolveria uma sessão de gastronomia, uma de cultura e arte e outra de exploração urbana. Em termos de gastronomia, os pontos fortes de São Paulo seriam a gastronomia nordestina e japonesa. No mundo da arte, acho que seria explorar a Pinacoteca e depois as artes de rua. Em termos de exploração urbana, um bom tour entre os prédios clássicos do centro e depois uma caminhada até Higienópolis mostrando o modernismo e até uma evolução da cidade.
Acho que eu me prenderia entre a região central de São Paulo, ficando entre Liberdade, Centro, Santa Cecília e Higienópolis, porque circular entre esses bairros é quase, quaaase, uma caminhada e, ao mesmo tempo, é super diversificado, com diversas culturas e diversas coisas pra fazer.
Ficha técnica
Direção criativa e fotografia: Wilmore Oliveira
Styling: Danilo Padilha
Produção: Jeanne Yépez e Gustavo Elsas
Vídeo
Imagens: Vitor Nomoto
Edição: Bruno Morieval e Clarissa Ribeiro
Cor: Alexandre Marcondes
Trilha: El Lif Beatz